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Osvaldo José da Silva Costa

1959 - 2020

Era uma vez um menininho que queria voar... E voou.

Esta é uma carta aberta de Mariana para o seu pai, Osvaldo:

"Eu tenho tanto pra lhe falar, mas com palavras não sei dizer... Como é grande o meu amor por você..."

Você gostava de cantar essa música no Natal, dizia que ela resumia o espírito da data... Seja o amor de Deus por nós, nosso amor a Deus, o amor à família, o amor ao próximo... Dizia que as pessoas precisavam aprender a amar mais a Deus e menos a religião... Que as pessoas tinham que colocar mais amor nas palavras, nos gestos, nos olhares e ouvidos... Que para as coisas darem certo, só faltava isso: um pouquinho mais de amor no mundo!

Em você, por outro lado, nunca faltou amor... Não no menininho que cresceu querendo voar. O carioquinha órfão de um candango preto arretado e criado desde os 7 aninhos só pela mãe, uma alagoana semianalfabeta porreta que, desde cedo, arregaçou as mangas para aquele garotinho deixar que suas asas o levassem aonde ele quisesse, para além do morro da Mangueirinha, em Duque de Caxias.

E assim foi feito... Muito comprometimento. Muito estudo. Muita dedicação. Muito caráter. Muito propósito. Muita gratidão. Muitos sonhos... Muito amor! Veio a EPCAr, a AFA... E o rapaz voou! Literalmente. E só abandonou os céus desse país que tanto amava para traçar outros voos, diferentes dos que ele sonhava na infância, mas igualmente altos. Vieram os concursos, a graduação, a Susep, a Geru, o Defis e a Secretaria Geral. Mas, muito mais do que isso, veio a mamãe e a nossa família. E, por mais workaholic que você fosse, eu sei que éramos seu voo mais precioso... Não era à toa que você nos chamava de seu "pedacinho do céu".

Todo mundo sabe que eu sou parecida com você... E não é só porque eu sou a sua cara. É pela timidez, é pela capacidade de me manter serena sob as situações de stress extremo, é por esse apreço às palavras, é pelo meu lado "cdf" e minha alma obstinada, é pelas ironias e nossa supersagacidade, é pelo senso de justiça, é por tudo isso e muito mais... Você me ensinou a ser quem sou.

E, acabo de me dar conta: voltando à cantoria dos nossos natais, mesmo sem saber dizer com palavras, o tempo todo você tanto me falou e me ensinou, com gestos e olhares, com presença, com exemplo, com a sua vida, aquilo que eu mais me esforço pra escrever... o amor.

Agora, aquele garotinho que sonhava fez seu último voo... E, mesmo com meu coraçãozinho dilacerado de tanta dor e saudade, só posso agradecer por ter herdado um belo par de asas...

Espero apenas que, aí de cima, desse céu que você tanto ama, jamais se esqueça de como também é e sempre vai ser grande o meu amor por você... Maior que tudo nesse mundo.

Você é nosso céu todinho. Te amo! Pra sempre, papai... Do seu pedacinho do céu, Mariana.

Osvaldo nasceu no Rio de Janeiro (RJ) e faleceu no Rio de Janeiro (RJ), aos 60 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Osvaldo, Mariana de Almeida Valle Costa. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Lígia Franzin, revisado por Lígia Franzin e moderado por Phydia de Athayde em 5 de outubro de 2020.