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Ronaldo Souza da Silva

1980 - 2020

Um pavio curto, de coração grande.

Nas ruas da Brasilândia, bairro de São Paulo, um amigo de seu marido disse para Carla: “Olha, estou comprando roupa elegante e sapatos novos para o seu casamento”. Foi assim que ela soube que Ronaldo, com quem já estava unida há 25 anos, havia pedido sua mão. A história dos dois começou de outra forma. Adolescente, ela escondia o namoro da família. Ele, um dia, contou sobre o relacionamento — sem que ela soubesse — para o sogro, que o convidou para jantar.

O casamento era um dos três sonhos do mineiro genioso e engraçado de Lontra, que veio para São Paulo muito cedo, com a família. Ele, fiscal da linha Lapa-Santa Mônica, preparava-se para realizar o segundo, tornando-se motorista de ônibus. Recebia, diariamente, os colegas com um café preparado com carinho e com pães feitos pela esposa. Os pães eram parte do terceiro sonho do corintiano: aposentar-se, ter um sítio e vender os pães, do amor de sua vida.

Paciência? Ronaldo não tinha. Dizia para Carla: “...deixo para você”. Mas, carregava consigo uma espécie de perdão eterno. Não guardava mágoa alguma. Se o chateavam, resolvia logo sua dor. Diante dos efeitos da passagem do tempo, preocupava-se com Carla: “vai me trocar por um cabeludo”.

Adorava uma cerveja com os amigos e churrasco. Churrasco que não faltaria, na festa de casamento.

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Tinha um coração muito bom, não guardava mágoas.

Ser família era uma das suas maiores grandezas de vida. Por eles e para eles, enfrentava até seus medos.

E foi assim, com o amor dando coragem, que Ronaldo enfrentou o nervosismo que sentia quando ia aos hospitais, para ficar com sua esposa, Carla Cristina, até ver a carinha do seu filho.

Com o sorriso de pai, deu as boas-vindas a Miguel.

Ronaldo nasceu em Lontra (MG) e faleceu em São Paulo (SP), aos 40 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela esposa de Ronaldo, Carla Cristina dos Santos. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Rogério Zé e Francisco Júnior, respectivamente, revisado por Lígia Franzin e moderado por Edson Pavoni em 28 de dezembro de 2020.