1934 - 2020
Tinha nome de flor, exibia o mapa da Sicília na sala e fazia a melhor macarronada do mundo aos domingos.
Esta é uma carta aberta, escrita pela neta de Dona Rosa, Giulianna:
Dona Rosa fazia jus ao nome de flor, pois não importava a ocasião, estava sempre perfumada, arrumada e com as unhas feitas, pintadas em vermelho, sua cor favorita.
Nona, como eu a chamava, é a tradução de vovó em italiano e, se tinha algo do qual ela se orgulhava, era de sua terra natal. O mapa da Sicília ficava emoldurado na sala para todos verem, a tarantela tocava em todos os seus aniversários, os ditados italianos saíam da sua boca todos os dias e ainda tinha o sonho de registrar esses ditos populares em um livro pra que eles nunca se perdessem no tempo.
Nona gostava da casa cheia e da família reunida em volta de uma bela macarronada. Ela me contava histórias da Segunda Guerra Mundial, que aconteceu quando ela ainda era uma menina, falava dos aviões militares que rodearam a sua cidade, falava do navio que a trouxe para o Brasil, dos seus anos como costureira, do restaurante que construiu ao lado do meu nono, Pietro, e de como tinha fé no país que a acolheu.
Apesar da saudade da Itália, ela gostava de viver aqui. Dona Rosa foi mãezona, foi nona, foi uma mulher forte, que viu e viveu tudo intensamente.
E se nos últimos anos de sua vida, já não podia sair de casa para preservar sua saúde, soube encontrar alegria nos programas matinais, nas receitas da Ana Maria e nas novelas das quais não perdia um capítulo.
Nona, depois de todas as nossas conversas, eu já não vejo a morte como um ponto final, eu a vejo como uma vírgula. Não lhe digo adeus, e sim, até logo. Um dia nos reencontraremos, e eu espero que a senhora saiba que foi um enorme privilégio ser sua neta.
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Uma italiana em solo brasileiro.
Ela saiu de Villarosa, na região da Sicília, na Itália, para chegar ao Brasil em 4 de abril de 1954. Desembarcou em São Paulo para iniciar sua vida, mas jamais esqueceu suas origens italianas.
Gostava muito das reuniões familiares que aconteciam poucas vezes no ano. Mesmo morando distante, mantinha contato com seu irmão, Giácomo Baglio, para conversar e saber como a família estava. Sempre atenciosa e dedicada, nas festas era ela quem cuidava dos preparativos e dos alimentos. “Seu prato preferido era macarronada, fazia com muito capricho”, conta o irmão.
“Nas horas vagas, cuidava da casa e, sempre que possível, fazia comida italiana. Era uma maneira de se lembrar da sua terra natal”, conta Giácomo. Rosa gostava de ler livros e, nos últimos dias de vida, assistia muito à televisão. As conversas, nas reuniões familiares, eram em italiano, nada de língua portuguesa. Um pedaço da Itália estava sempre presente entre seus entes queridos durante esses momentos.
“Ela era muito querida e a forma como ela partiu foi muito triste para os filhos, foi uma angústia muito grande. Não conseguimos dar um último adeus, então o que permanece é a pessoa especial que ela era”, conclui Giácomo.
Rosa nasceu em Palermo, Sicília (Itália) e faleceu em São Paulo (SP), aos 85 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado de Rosa, Giulianna Palumbo e Giácomo Baglio. Este tributo foi apurado por Ana Macarini, editado por Ana Macarini e Elias Ambieda de Vargas, revisado por Lígia Franzin e moderado por Ana Macarini em 10 de janeiro de 2021.