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Sérgio Carlos Antônio da Silva

1970 - 2020

Abria mão de seus sonhos para realizar os dos outros. Estava sempre pronto para ajudar a quem precisasse.

Sérgio veio de uma família grande. Dos cinco irmãos, ele era o mais alegre e brincalhão. Dono de um raciocínio rápido, gostava de “tirar onda” com todo mundo. Sempre encontrava um jeito de fazer piada, até mesmo nos momentos difíceis. Com seu sorriso fácil, contagiava quem estivesse por perto. Isso fazia dele a alegria dos churrascos e dos encontros de família. Todos queriam sua companhia.

Quando criança, gostava de visitar a casa dos avós, em Minhas Gerais, e comer as linguiças defumadas e assadas no fogão à lenha. Em uma ocasião, a avó fez questão que a família levasse abóboras para casa. Mas o trajeto até a rodoviária era longo e tinha de ser feito a pé. Mesmo assim, com muito esforço, todos ajudaram a carregá-las. Chegando em casa, descobriram que elas não estavam boas para comer. Ficaram frustrados, inclusive Sérgio, sendo essa uma das poucas vezes que perdeu o bom humor.

Muito carinhoso com seus pais, chamava a mãe de “Vó”. Quando seu pai adoeceu, fez questão de estar sempre presente para ajudá-la com os cuidados necessários. Auxiliava no banho, a cortar a unha e o cabelo. Sempre cuidou do pai. Sérgio gostava sempre de ser prestativo. Pouco antes de pegar Covid-19, como não estava trabalhando em emprego fixo, usou suas habilidades para pintar a casa de sua mãe. Anos antes, já havia pintado também a residência da irmã.

Era dono de um grande coração. “Maior que ele”, define a irmã Sueli. Batalhador, começou em um emprego desde cedo para ajudar os irmãos e seguiu trabalhando para realizar seus sonhos e os de sua família. Motorista particular de profissão, atuou por muitos anos em uma casa onde era muito querido pelas crianças que lá moravam. Sempre as levava a um sítio para jogar bola. Gostavam da companhia de Sérgio. Esteve com essa família até os meninos crescerem.

Sérgio era também muito comprometido e não gostava de deixar ninguém esperando. Quando combinava algo, era certo que estaria lá. Certa vez, a irmã Sueli planejou uma festa de aniversário surpresa para ele. Sem saber, Sérgio já havia marcado outro compromisso na data. Para não deixar na mão a pessoa com quem tinha combinado, ficou na festa surpresa apenas por pouco tempo, apesar de ter ficado muito feliz com a homenagem. Piadista como sempre, não perdeu a oportunidade de fazer uma brincadeira com a irmã: “vai ser um velório sem morto, pois o aniversariante vai ter que ir embora”.

A esposa Elaine, ou Chiquinha, como ele gostava de chamá-la, era seu amor de adolescência. Amiga de escola de sua irmã, encantou-se por ela quando ia em sua casa estudar. Ficava por perto, inventando qualquer desculpa para puxar assunto e ter sua atenção. A tática deu certo. Anos depois, se casaram e viveram uma linda história de união e companheirismo. “Eles eram um grude”, diz a irmã Sueli. Marido dedicado, era do tipo que levava café da manhã na cama para a esposa; a deixava no trabalho e mais tarde ia buscá-la. Fazia questão de aproveitar cada minuto dos raros momentos de folga na companhia dela e do filho. Pela família, abriu mão até mesmo de tomar sua cerveja. Queria mais tempo para estar com eles. Elaine fala que o marido era “seus braços e suas pernas”.

Adiou seu sonho de reformar a casa e de ter um carro para realizar o desejo do filho de estudar em uma renomada faculdade de São Paulo. Tinha muito orgulho em vê-lo formado. Apesar de jovem, como começou a trabalhar cedo, estava próximo à aposentadoria. Tendo o filho concluído a faculdade e com a casa já reformada, sonhava em viajar e conhecer o Brasil e o mundo. Queria repetir a experiência inesquecível de andar de avião, pois só tinha feito isso uma vez, em uma viagem ao Ceará, como presente de Chiquinha.

A irmã Sueli destaca que cada momento vivido com Sérgio foi único e especial. Ele falava que dessa vida não levamos nada e que, por isso, tinha de ser aproveitada de forma leve. "Ele era o melhor de nós", completa com saudade.

Sérgio nasceu em São Paulo (SP) e faleceu em São Paulo (SP), aos 49 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela irmã de Sérgio, Sueli da Silva. Este tributo foi apurado por Emily Bem, editado por Marília Ohlson, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 20 de setembro de 2021.