Sobre o Inumeráveis

Sérgio Ricardo de Almeida Alves

1976 - 2020

"Aqui não tem tristeza", decretava a pessoa mais animada da festa. A festa era a vida; ele era a lei vitalícia.

"E pela minha lei a gente era obrigado a ser feliz”. Chico Buarque de Holanda criou e cantou este decreto, mas quem mais o executou na vida foi Sérgio. "Serginho": diminutivo que ganhou da mãe; talvez explicado pelo intuito de fazê-lo caber por inteiro na vida, com toda a sua grandiosidade imensurável. O alagoano era alegria, força e fé - frase redundante para qualquer nordestino, mas permitida pela licença poética que o poder da reafirmação pede.

Sérgio, em suas filosofias de vida, bem sabia que o tempo e as circunstâncias levam as pessoas para novos e outros rumos. Mas a geografia de sua alma não tinha fronteiras e convertia a distância de cada quilômetro em possibilidade. Se, por exemplo, um dos seus amigos fazia aniversário, era o primeiro a enviar um áudio no grupo. Não satisfeito, precisava garantir a felicitação no "privado". Sem falar no tanto de chamadas de vídeo... inumeráveis em quantidade e em importância. "Penso que essa distância que a vida impôs a cada um de nós deu um valor especial ao sentimento da amizade", conta a amiga Adelaide sobre este elo forte e singular que segue perpétuo.

No fim das contas, as palavras ditas diziam muito mais sobre o amante da conexão ilimitada do que sobre o que elas realmente queriam dizer. Assim, é justo pensar que o não envio de um bilhete ou um áudio de despedida já é, por si só, um recado que confirma a vida de Sérgio. Ele será sempre lembrado: em forma de "bom dia", de risada, de lei que convoca o mundo a ouvir Raça Negra e até ao ecoar do bom e velho forró do nosso nordeste - o brasileiro, mas também o subjetivo que está situado em cada coração humano.

"Nós sentiremos saudades de todas as conversas jogadas fora, das descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos que compartilhamos...", lembra Adelaide numa homenagem que nega a tristeza. "Não pode ser triste, porque você não era triste."

Sérgio nasceu em Maceió (AL) e faleceu em Natal (RN), aos 44 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela amiga de Sérgio, Adelaide Maria Wanderley Nogueira Barros. Este tributo foi apurado por Rogério Oliveira, editado por Irion Martins, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 29 de julho de 2020.