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Valter Frederico

1945 - 2020

Um jovem galanteador que amou sua tímida rainha por 50 anos como naquela noite do primeiro baile.

Carta aberta da filha Márcia ao pai, senhor Valter Frederico.

Meu pai foi a pessoa que mais sorria e tinha um senso de humor muito desenvolvido. Via a vida da forma mais positiva possível e buscava sempre o que o outro tinha de melhor. Aos filhos, deu o melhor de si. Na sua simplicidade, ensinou que honestidade é a principal característica que uma pessoa pode ter.

Aos netos, dedicou toda sua doçura e tempo. Não existirá avô mais presente. Era capaz de desdobrar-se para deixar e buscar todos os netos na escola. As refeições de domingo, eram maravilhosas. Era o último a sentar-se a mesa, somente depois de verificar que todos estavam presentes.

O amor da vida dele, minha mãe (Maria Ivone Pianez Frederico), era tratada como rainha. Os 50 anos de casados foram comemorados no final do ano passado e esse amor era tão grande, que Deus não foi capaz de separá-los: os dois faleceram com Covid no mês de julho de 2020.
Amo você, pai!

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Carta aberta do filho Márcio ao pai, senhor Valter Frederico.

Pai... Muito obrigado por tudo que fez por mim, pelo homem que sou hoje, pelos puxões de orelha, pelos ensinamentos, por todas as vezes que me socorreu, por todas as vezes que estendeu a mão para mim, quando eu achei que ninguém fosse aparecer... O senhor apareceu! Quando achei que ninguém pudesse me ajudar... O senhor ajudou!

Obrigado por ser exemplo aos seus netos e por falar neles, quanto tempo, amor e carinho que dedicou a eles! Espero que eles possam ser como o senhor.

Quanto amor, quanta dedicação, quanta paciência e o mais importante, sempre de bom humor, sempre brincando, sempre tornando tudo mais leve! Tenho certeza meu pai, a sensação é de dever cumprido, fez de minha mãe uma rainha, por longos 50 anos!

Sr. Valter e Dona Ivone, é hora de descansar. Fiquem tranquilos, aqui eu, a Jú, a Márcia e o Ronaldo estamos cuidando de tudo e de todos. Vamos chorar sim, vamos sentir saudades sim, ficaremos com os corações dilacerados por muito tempo, sim. Mas, com a certeza que fizemos tudo que poderia ser feito e que a vontade do Nosso Deus sempre prevalece! Só peço que aí de cima cuide da gente! Guie nossos passos e nos livre das armadilhas da vida.

AMO VOCÊS!!

Minha eterna gratidão!

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Carta aberta dos filhos Márcia e Márcio ao pai, senhor Valter Frederico.

Domingo: esse era o dia preferido de nossos pais. Desde crianças, a mesa da sala de jantar era o nosso ponto de encontro todos os dias à noite para a refeição. Mas, o domingo era especial. Em volta da mesa, tudo era compartilhado. Não havia assunto proibido.

Fomos aprendendo ao redor da mesa, que nossos pais eram ainda muito jovens, quando se conheceram em um baile. O jovem educado e galanteador, ganhou o coração da jovem tímida de olhos castanhos esverdeados e cabelos lisos. Foi amor à primeira vista e, pouco tempo depois, já estavam casados.

A vontade de constituir família era tanta, que o primeiro filho chegou, antes mesmo, do primeiro ano de casamento. A família cresceu ainda mais e, passados sete anos de casados, estavam com três filhos.

A vida não era nada fácil. Nosso pai saía para o trabalho sem hora para voltar e nossa mãe cuidava de tudo e de todos sozinha. Apesar das dificuldades, o esforço de cada um, era sempre recompensado com o sorriso e o amor do outro ao final do dia. Apesar do cansaço, todos estavam à mesa na hora do jantar. Era o momento de falarmos sobre as alegrias, as tristezas, as conquistas, os fracassos, enfim, era o momento de dialogar.

E assim, com muito diálogo, fomos crescendo. Nunca houve um tapa sequer.
Nosso pai era a pessoa mais paciente do mundo. Para ele, tudo podia ser resolvido sem conflitos. Nossa mãe, apesar de parecer muito séria, era sinônimo de doçura e dedicação maternal: tudo que realizava, era para os filhos.

Crescemos testemunhando o amor de nossos pais. Sempre foi uma relação de muito respeito e companheirismo. Não havia local que um estivesse sem o outro. Na Igreja, local sagrado que frequentávamos todos os domingos juntos, eles eram membros ativos da Pastoral da Família.

O exemplo de casal que tínhamos dentro de casa nos despertou para o desejo da nossa própria família. Assim, nos casamos e também buscamos por nossos caminhos, apesar do encontro semanal ao redor da mesa acontecer todos os domingos, agora com a presença das noras e genro.

Mas, acreditamos que a chegada dos quatro netos (3 netos em apenas 10 meses) e, depois de quase 10 anos mais uma netinha, foi o ápice da vida de nossos pais. Não houve no mundo, dedicação maior. Tudo o que pensavam, falavam, faziam e compravam era para os netos. Brincavam durante horas no quintal. Conseguiam transformar-se em crianças novamente. O pai e a mãe que já eram dedicados, eram agora vovô e vovó sem comparação. Têm pelos netos, um amor incondicional.

Entretanto, nessa história, nem tudo são flores! Há 7 anos, nossa mãe ficou muito fragilizada com a morte do filho mais velho, morto em decorrência de um latrocínio. Desenvolveu fibromialgia e uma grande dificuldade de locomoção. Muito guerreira e de fé extrema, superou uma depressão profunda e nunca aceitou um andador, utilizando apenas uma simples bengala.

Foi então, que nosso pai provou o amor que sentia por nossa mãe e passou a ser o seu maior admirador. Já aposentados, ele nunca a deixava sozinha. Ajudava em todas as tarefas domésticas e a levava em todos os lugares que queria.

Adoravam ir para a praia, apenas para ver e ouvir o mar. Gostavam sempre de refazer a viagem de lua de mel em Poços de Caldas e, até mesmo visitar as Cataratas do Iguaçu, com toda dificuldade de locomoção, nossa mãe foi, sempre amparada por nosso pai. Não havia lugar que ela não pudesse ir. Ele sempre dava um jeito de levá-la.

Enfim, nossa mãe era doce como seus bolos e nosso pai, sereno como uma brisa. Uma relação linda, firmada na fé, que durou 50 anos e foi comemorada no final de 2019 com uma bonita festa. Festa essa, que era o sonho dos dois. Famílias reunidas, filhos presentes, cerimônia religiosa e netos prestando homenagens e mais homenagens.

Dentre os vários momentos emocionantes da comemoração das Bodas de Ouro, podemos destacar a homenagem de nossos pais ao filho falecido e com certeza, um momento mais do que especial, foi a entrada da neta mais nova (3 anos), como daminha levando as alianças, ao som do violino tocando Ave Maria. Fizemos surpresa desse momento para meus pais e foi extremamente emocionante para eles, levando muitos convidados às lágrimas também.
Para nós, os filhos, esse momento foi mágico.

Era simplesmente, a renovação de tudo o que vivemos durante uma vida inteira. E, na mesa da sala de jantar, durante vários domingos seguintes à festa, pudemos aproveitar da alegria deles por viverem tão intensamente esse amor. E o amor era tanto, mas tanto, que decidiram que ficariam juntos eternamente.

Nossa eterna gratidão!

Márcia Frederico Toledo

Márcio Frederico

Dezembro/2020

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Esta é uma história de casal. Para conhecer a história da esposa de Valter, busque por Maria Ivone Pianez.

Valter nasceu em Campinas (SP) e faleceu em Campinas (SP), aos 75 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelos filhos de Valter, Márcia Frederico de Toledo e Márcio Frederico. Este tributo foi apurado por -, editado por Ana Macarini, revisado por Gabriela Carneiro e moderado por Rayane Urani em 19 de dezembro de 2020.