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Marcelo Alves da Rosa

1983 - 2020

Era, sem sombra de dúvida, o super-herói da generosidade, mesmo que não tivesse capa ou soubesse voar.

Marcelo foi adotado aos quatro anos de idade por Dona Iracema, que fez o mesmo com outros três meninos dos quais ele era o caçula: Alex, Wagner, Alejandro. Quando ela faleceu, sua filha mais velha, Dona Norma, assumiu a criação dos meninos que, mesmo sendo cada um filho de uma mãe diferente, tornaram-se irmãos por meio da adoção. Todos a chamam de mãe.

Era muito apegado a ela e, para ficar perto, chegou a alugar uma casa na rua em que ela morava. Com ela, tomava seu café da manhã todos os dias antes de ir trabalhar.

Trabalhador, dedicado, não tinha inimizades, era um menino que só fazia o bem. Era como um irmão que buscava sempre uma solução. Sempre foi generoso com todos, tirava de si mesmo para dar a quem precisasse e, se preciso, tirava da própria boca para servir aos outros.

Certa vez, uma das filhas de Norma se separou do marido, ficou numa situação financeira bem difícil e morando numa casa muito humilde. Nessa ocasião, construiu uma boa casa no terreno da mãe para que a sobrinha pudesse ter uma moradia segura com suas filhas.

Marcelo escolheu a Enfermagem porque sempre gostou de ajudar as pessoas. Começou como cuidador de idosos seguindo o exemplo de sua cunhada Nilva. Quando começou a fazer o curso de Enfermagem, uma de suas sobrinhas estava se formando neste mesmo curso e isso serviu como estímulo para ele, pois, vendo a sobrinha adorar o trabalho que fazia numa clínica, descobriu que era isso que queria fazer também.

Nas horas livres, quando não estava de plantão, gostava de ir à academia ou passava horas com seu melhor amigo, Rogério, jogando videogame.

Marcelo trabalhava em um hospital onde ajudava a todos em seus plantões. Lá ele era conhecido como “Mestrinho”, apelido que lhe foi dado por Raquel, uma amiga de profissão. Ela contava que toda vez que chegava um enfermeiro ou enfermeira novatos no trabalho, ele fazia questão de “colar” na pessoa, orientar, ensinar, apoiar, dar todo o suporte. Daí, passaram a chamá-lo de Mestre e, depois, mais carinhosamente, Mestrinho.
Atuando na linha de frente no combate ao coronavírus, foi o primeiro enfermeiro a falecer de Covid-19 em Campinas.

Mestrinho tinha muitos sonhos e o maior deles, para o qual estava se preparando, era ser bombeiro. Ele dizia que queria essa profissão para poder ajudar mais pessoas e salvar mais vidas. Para ele, ser bombeiro era o melhor jeito de chegar perto de ser um super-herói.

Mestrinho tinha muito talento na área de Enfermagem, mas como ninguém é bom em tudo que faz, isso lhe faltava na área da confeitaria. Certa vez inventou de fazer bolos, mas esses nunca davam certo. Uns murchavam, outros ficavam duros e ninguém conseguia comê-los.

De acordo com seu irmão Wagner, “Marcelo era um cara fora de série. Ele era demais. A melhor pessoa que eu conheci na vida. Que saudades de você, Mestrinho”.

Marcelo nasceu em Campinas (SP) e faleceu em Campinas (SP), aos 37 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo irmão de Marcelo, Wagner Moreira Chaves. Este tributo foi apurado por Renata Federici, editado por Vera Dias, revisado por Gabriela Carneiro e moderado por Rayane Urani em 20 de novembro de 2020.