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Vera Lúcia dos Santos

1955 - 2021

Com compaixão e caridade, amou e ajudou a todos que conheceu.

Nascida nos anos 50, fez parte de uma geração de mulheres que ainda precisava conviver com a submissão ao masculino, mas, não obstante, recebeu uma grande influência de sua irmã mais velha, enfermeira desde os 15 anos de idade, seu maior incentivo para desenvolver sua liberdade e autonomia como mulher.

Casou-se aos 24 anos e teve, com muito amor, dois filhos. Divorciou-se quando o mais novo ainda não tinha completado um ano de idade e, a partir daí, viveu a difícil a tarefa de ser mãe solo, executiva e, ainda, conseguir realizar seus trabalhos de caridade.

As dificuldades não a impediram de formar nos filhos os valores éticos e morais, ao mesmo tempo em que se dedicava a ajudar aos mais necessitados e, assim, eles cresceram ouvindo que: “É preciso ajudar aos outros para estarmos perto de Deus. Se não quiser, não precisa ir à igreja. Faça o bem, que é melhor.”

Exortação que soava um pouco estranha porque ela era filha de uma família extremamente católica e atuante na igreja São Pedro da Vila Talarico, Zona Leste de São Paulo, mas afirmava sem medo e com a firmeza de quem sabia exatamente o que estava ensinando. Esta sua “subversão” aos compromissos semanais com a Igreja, não a deixou menos fiel e, ao contrário, teve uma trajetória sempre o mais próximo possível aos preceitos de Deus.

Dona Vera, como muitos a chamavam, sempre esteve disposta a ajudar. Colaborou por dez anos no Departamento de Próteses da AACD. Participou diversas vezes do Natal Solidário realizado por um grupo de igrejas do bairro do Brás, distribuindo centenas de pratos de comida a moradores de rua. Adotou muitas e muitas pessoas com o seu amor fraterno e doou-se a todos, mais do que a si mesma.

Sua família conta um sem-fim de histórias de sua solidariedade. A maior delas, foi transformar a própria casa em um leito de hospital por dez anos para cuidar do seu irmão João após ele ter sofrido um AVC que o deixou em estado vegetativo.

Na vida profissional ela chegou ao cargo de coordenadora dos agrônomos do Banco Noroeste, responsável pela logística dos trabalhos do Departamento De Crédito Rural, um dos mais importantes daquela instituição na década de 80.

Depois de se aposentar estudou por algumas semanas e tornou-se corretora de imóveis, uma ótima opção para quem adorava conversar e fazer amigos. Assim ela se manteve ativa até seus últimos dias.

Em 2016, descobriu um câncer nas mamas que foi tratado com muita força e sabedoria. A partir daí, ela se reinventou e passou a não postergar suas vontades: reencontrou amigos, frequentou aulas de hidroginástica, fez muitas e muitas festas, viajou, namorou, foi feliz.

Em sua vida semeou tanto amor, compaixão e caridade, que até mesmo no momento de maior dor, teve a benevolência divina podendo contar com uma ótima equipe médica e ser visitada diariamente, privilégios que poucos possuíram.

Sua partida foi como ela sempre ensinou: que o que realmente fica marcado não é das esferas física, material ou monetária. Por ela ficaram os sentimentos de orgulho por sua brava luta de uma vida e pelo amor e doação àqueles que necessitavam e, acima de tudo, a gratidão por não só por ter dado a vida aos filhos, mas por fazer dela um caminho repleto de amor, amizade e cumplicidade.

Felizes os que puderam conviver e estar ao seu lado até o último momento para dizer-lhe desse orgulho e gratidão.

Sua família se apoia na certeza de que o plano espiritual precisa dela e que sua caridade e benevolência serão reverberadas do céu para a Terra, para poder ajudar mais pessoas.

Vera nasceu em São Paulo (SP) e faleceu em São Paulo (SP), aos 66 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Vera, Fernanda Argentino Tellini. Este tributo foi apurado por Rayane Urani, editado por Vera Dias, revisado por Luana Bernardes Maciel e moderado por Rayane Urani em 9 de maio de 2021.