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Wagner Luiz Vieira

1941 - 2020

Saía escondido com os netos para comprar batatas fritas e beber um chope geladinho.

À primeira vista, Wagner Luiz aparentava ser um homem sério e reservado, mas bastava sentar-se próximo a ele para descobrir, por suas histórias e ideias, que ele era um homem à frente de sua época. Aposentado há pouco mais de vinte anos, Wagner vivia intensamente seus dias. Em sua rotina cabiam diversas atividades: caminhar, ir à padaria, ter uma divertida discussão com a esposa sobre quais panelas usariam para preparar o almoço, tirar uma sesta e jogar buraco "online" até o sono pesar seus olhos.

Mineiro por naturalidade, escolheu a cidade de Brasília para ser seu lar. Wagner cultivava imenso amor pela Bahia e apreciava intensamente os momentos solitários que tinha. Com o silêncio a sua volta, sua mente tornava-se barulhenta e conseguia debruçar-se sobre os pensares da vida. Aproveitava a quietude do amanhecer para sentar-se na varanda e observar a rotina dos pássaros e dos micos da região. Transbordava de alegria quando podia partilhar esse momento com quem amava. Wagner foi um homem correto, justo e que não gostava de poupar palavras e demonstrar seu amor por sua família.

Preferia viajar de carro e ir apreciando cada nova cidade descoberta; planejava com diligência conhecer as belezas e nuances da cidade gaúcha de Gramado e apreciar os vinhos da região. De segunda a sexta-feira exercia a paciência para driblar a ansiedade que surgia em seu coração por aguardar a chegada dos netos. Ao lado deles sentia-se realizado. Elaborava os planos perfeitos para saírem escondidos a fim de comprar batata frita e tomar um chope gelado. Além das escapadas, Wagner gostava de alegrar os netos com respostas inesperadas. "Eu tinha uma cachorrinha que já estava bem velhinha e estava perdendo os dentes. Minha filha chegou perto dele e disse: 'Vô, a Meg perdeu um dente'. Ele olhou pra ela e falou: 'Ah! Sua avó é um caso sério'! e todo mundo começou a rir, pois ele estava parecendo a velha surda do quadro A Praça É Nossa", recorda Carla, filha de Wagner.

Fazia parte da rotina de Wagner manter-se informado, fazia questão de assistir ao noticiário esportivo antes do almoço e só fazia a refeição se houvesse salada. Nos últimos vinte anos dividia a responsabilidade de preparar o almoço com sua amada, momento em que se divertiam juntos e competiam pelas panelas. Wagner também gostava de dividir essas atividades com os netos, que vinham visitá-lo no final de semana. Em alguns sábados, gostava de reencontrar os amigos que fizera quando trabalhava. A reunião acontecia no Bar do Tiêta, onde não faltavam horas de conversas e chope.

Wagner nasceu em Machado (MG) e faleceu em Brasília (DF), aos 78 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Wagner, Carla Cristina Vieira. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Claiane Lamperth, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 18 de outubro de 2022.