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Zenilde Batista dos Santos Rullo

1960 - 2021

Mesmo ficando apreensiva para descer ou subir a serra para o litoral, desfrutava com alegria das viagens ao lado do seu grande amor.

Zenilde e Osni conheceram-se ainda na infância, quando eram vizinhos, aproximaram-se durante a juventude frequentando a mesma igreja e a partir daí namoraram por sete anos. Viveram um casamento que durou trinta e seis anos, imersos em uma paixão que ele descreve dizendo:

“Além de meu amor, ela era a minha amiga e companheira. Gostava de estar comigo em todos os lugares e sempre de mãos dadas. Foi uma esposa extremamente cuidadosa! Dizia costumeiramente que eu fui uma pessoa especial que Deus colocou em sua vida.”

Eles foram pais de Bruna e ela sempre se desdobrou para ofertar à filha tudo o que há de melhor. Algumas vezes demonstrava uma postura rígida e preocupada, mas isso era apenas o seu modo de empenhar esforços na tarefa de educar porque, na realidade, por trás daquele ar austero, havia uma mãe que se desmanchava em amor pela filha.

A vida lhes deu de presente a neta Heloísa, que transformou totalmente a vida de Zenilde. Com ela, reaprendeu a trocar fraldas, estando sempre empenhada em paparicá-la e a comprar-lhe algum mimo. Demonstrava muita satisfação em cuidar da menina quando Bruna precisava se ausentar. Nestas ocasiões, ficava tão preocupada com o bem-estar da neta que não media esforços para que ela tivesse o máximo de conforto.

Osni conta que Zenilde era tímida, mas muito amável com todas as pessoas ao seu redor. Em casa, era esposa, mãe e avó extremamente amorosa e devotada, que fazia o possível para ver a família feliz!

“Aos sábados, comíamos pizza, que era o prato predileto dela. Também gostava de reunir a família para o almoço de domingo, quando preparava uma macarronada sem igual. Nas horas vagas ela gostava bastante de assistir doramas, séries asiáticas de romance, e também de conversar com a vizinha Maria Dalziza, que considerava grande amiga e confidente.”

“Uma vez ao ano tínhamos o costume de viajar, somente ela e eu. Nossa última viagem de férias foi extremamente especial! Fomos a Gramado, que, desta vez, trouxe uma sensação mágica. Passeamos por inúmeros pontos turísticos, experimentamos todas as comidas da cidade e usufruímos da companhia um do outro. Foram momentos inesquecíveis e ela era a melhor companhia deste mundo!”, diz com saudade.

Zenilde exerceu por mais de dez anos a função de Caixa de Banco, depois trabalhou em algumas outras empresas. Com o nascimento de Bruna, optou por cuidar da casa e da filha, e, enquanto trabalhava fora, foi sempre uma profissional correta, responsável, dedicada e muito querida pelos colegas de trabalho.

Certa vez, deu um troco maior para um cliente e só percebeu o engano quando foi fechar o caixa ao final do dia. Quando identificou quem era a pessoa, por sinal pessoa muito conhecida na cidade, foi até a casa dela na tentativa de recuperar o dinheiro. Tal pessoa, por sua vez, apesar de admitir a situação embaraçosa, recusou-se a devolver o valor excedente. E foi aí que os colegas demonstraram o apreço que tinham por ela, realizando uma vaquinha entre eles e devolvendo toda a diferença ao Banco.

Osni demonstra grande admiração pela fortaleza que Zenilde representava relatando situações em que isso se tornava mais evidente:

“No início do nosso casamento, passamos por momentos financeiros delicados. Entretanto, ela foi o meu suporte, mantendo-se a todo instante ao meu lado, dizendo palavras de incentivo e me animando. Ela sofria de dores muito fortes nas pernas, nos ombros e na coluna. Como não queria deixar ninguém preocupado, nunca reclamava.”

“Durante muitos anos, todas as manhãs, tinha o costume de tomar café com os pais dela, que eram aposentados. Entretanto, após a partida do seu pai, a sua mãe, que estava com a saúde debilitada, foi morar conosco. Nesta época, Zenilde aprendeu a dar banho, colocar comida na boca e a ter bastante paciência com a mãe.”

De sua memória brotam lembranças que para ele se tornaram inesquecíveis, como as risadas que davam quando surgia uma lembrança do início do casamento; a noite em que acordou com ela sonhando, com as mãos no seu pescoço, como se o quisesse estrangular; e do pavor que ela sentia quando precisava subir a serra da Rodovia dos Imigrantes ou descer a serra da Anchieta... “Por isso, lembro nitidamente que quando terminávamos de subir ou descer os morros ela sempre dava um longo suspiro e se ajeitava mais tranquila no banco”, suspira ele saudoso.

O marido relembra também do quanto ela desejava que vivessem juntos até o fim de suas vidas, usufruindo da companhia um do outro na velhice, reafirmando, assim, que o amor verdadeiro existe. “Eu adorava vê-la feliz! Quando viajávamos ou estávamos passeando, sempre perguntava: 'Você está feliz?' Percebi que ela era o meu suporte, o meu alicerce, a minha base e até o meu equilíbrio para me manter erguido”.

“Depois que Zenilde se foi, conversei inúmeras vezes com Deus e tento ressignificar de alguma forma a minha vida, tendo a certeza de que ela jamais será esquecida. Eu me sinto um homem sortudo porque pude ter a companhia da minha esposa. Creio que se eu fosse contar tudo que o ela significou para mim, não haveria espaço suficiente nesta homenagem...”, finaliza Osni.

Zenilde nasceu em Itanhaém (SP) e faleceu em Santos (SP), aos 60 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo marido de Zenilde, Osni Rullo. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Vera Dias, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 26 de agosto de 2023.