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Eloi Alves do Nascimento

1936 - 2020

Retirante nordestino e devoto de Padre Cícero; com a cara e a coragem ajudou sua família a construir uma vida melhor.

Esta é uma carta aberta de Maria Cleide para o seu pai, Eloi:

Meu pai, um homem forte. Retirante nordestino - destes que ajudaram a construir São Paulo -, veio do interior de Alagoas na década de 60, com a tentativa de prover uma vida melhor para a sua esposa e filhas. Talvez nunca tenha notado, mas se hoje seus netos e bisnetos têm a oportunidade de estudar em uma universidade, trabalhar em um local decente com ar condicionado ou escolher um restaurante para jantar no final de semana, tudo isso se deve muito ou quase tudo a sua coragem.

Uma pessoa simples, sem grandes ambições. Bastava um prato farto, com um bom pedaço de carne, que já se sentia feliz. Dizia-se um homem abençoado por Deus, pois no auge dos seus 84 anos, tinha uma "saúde de ferro" e amava se gabar por isso. Além de ser ativo, era independente tanto financeiramente como fisicamente.

Otimista de espírito elevado e evoluído, era devoto de seu querido "Padin": o Padre Cícero de Juazeiro do Norte. Mostrava ter confiança em Deus e no seu chamado, aceitando seu destino. Só se preocupava com o bem estar de minha mãe, sua companheira de sessenta anos, que carinhosamente chamava de "nega". Sonhador, fazia planos todos os dias, como se ainda tivesse 30 anos; e falava que só deixaria de sonhar quando estivesse "olhando para seu dedão do pé".

Quando foi internado devido a Covid-19, saiu de casa abraçado com uma imagem de Nossa Senhora Aparecida - a qual também era devoto - e, olhando todos cômodos da casa, no fundo sabia que não voltaria a ver aquelas paredes que ele mesmo havia construído a mais de trinta anos. Emocionado, parou em frente a esposa para se despedir, mas minha mãe não quis despedida, ela tinha esperança de que ele retornaria. Nesse momento meu pai disse: "Só quero um beijo"; uma cena que jamais esquecerei.

Poderia citar muitas coisas sobre você, meu pai. Seu carinho, sua energia, seu amor e orgulho pela família, sua abnegação pelas coisas materiais, sua bondade com o próximo, sua dedicação com minha mãe. Ainda assim, isso não seria o bastante.

E como deixamos escrito em sua lápide: ali repousa o que era mortal de Eloi, pois seu amor, alegria, otimismo e bondade a morte jamais será capaz de levar!

Esperamos ansiosamente pelo nosso reencontro.

Eloi nasceu em Anadia (AL) e faleceu em São Paulo (SP), aos 84 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Eloi, Maria Cleide do Nascimento Sega. Este tributo foi apurado por Rayane Urani, editado por Felipe Bozelli , revisado por Luana da Silva e moderado por Rayane Urani em 7 de fevereiro de 2022.