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Irineu Umbelino

1959 - 2020

Era tão generoso e querido que até ganhou festa surpresa dos passageiros da linha de ônibus que dirigia.

Irineu contava que na sua infância trabalhou muito na roça e se definia como tendo sido muito namorador na juventude.

Os sobrinhos o chamavam de "O Jovem" porque ele não aceitava ser chamado de senhor de jeito nenhum; não se sentia como tal. E com sua alma de menino, possuía uma maneira especial de corrigir os filhos sem julgá-los, de lhes dar conselhos e até puxões de orelha, se necessário, mas era muito amigo deles e fazia questão de reafirmar isso.

Muito amoroso e cuidadoso, comemorava com eles cada conquista, desde o carro rebaixado e equipado com um bom som pelo filho mais novo, até o nascimento do neto, que para ele foi a maior realização. Foi uma longa espera. Somente depois de dez anos de tentativas, a filha Vanessa lhe deu seu netinho. O vovô não desgrudava um só minuto dele.

Ele era e se intitulava o "Vovô Coração" e “...para ele, sempre era hora para um abraço...estava sempre pronto para orar por nós se algo não estivesse bem”, conta Vanessa e acrescenta: “Toda vez que vinha do mercado trazia o Danoninho do neto. No colo do vovô, o Heitor sempre gostava de mexer no cotovelo e, assim, nós sempre encontrávamos os dois dormindo enquanto passava um desenho na TV que eles assistiam juntos”.

Irineu foi casado por 33 anos e a diferença de idade entre ele e a esposa era de onze anos. Conheceram-se quando ele foi viajar para uma cidade do interior onde moravam seus pais e ela era amiga do seu irmão caçula. Ele sempre disse que foi amor à primeira vista e, então, voltou da viagem, terminou seu noivado e foi para o interior para ficar noivo dela. Simples assim...!

Ele amava quando ela lhe fazia cafuné todas as noites até ele dormir. Eram inseparáveis, companheiros, amigos, sempre sonhando e correndo atrás para realizar tudo, caminhando lado a lado. Não deixava a esposa fazer um mercado ou enfrentar uma fila nas lotéricas.

Trabalhou por 30 anos como motorista de ônibus fretado e, sempre que lhe era possível, ia buscar a filha na escola. Quando chegavam em casa, montava uma salada de carinha feliz que os filhos amavam e os levava para andarem de bicicleta e soltar pipa.

Sua relação com os passageiros dos ônibus que dirigia era diferenciada. Relembra Vanessa que: “quando não conhecia a linha que ia percorrer, fazia doce de amendoim caseiro para agradecer aos passageiros que ensinavam o novo itinerário para ele. Estes, por sua vez, demonstravam enorme carinho por ele, e sempre o presenteavam. Um dia voltou super feliz para casa, porque fizeram uma festa surpresa de aniversário para ele dentro do ônibus”.

Quando se aposentou esteve em casa por uma ano, mas por amor ao trabalho, não suportou ficar sem fazer nada e retornou à mesma atividade e nela permaneceu por mais oito meses até ser afastado durante a pandemia, por fazer parte dos grupos de risco.

Era calmo, gostava de conversar, ouvir louvor e pescar. Evangélico ativo na igreja, ele ministrava, mas o que mais amava era louvar no culto da Santa Ceia e fazer tudo na fé em Cristo.

Era um paizão alegre, que amava ver os filhos reunidos e tinha por hábito, antes da festa começar, sempre reunir todo mundo para orar. Apesar de gostar muito dos encontros familiares, nunca havia conseguido reunir todos os irmãos em um único evento até que, em seu aniversário de 60 anos, foi organizada uma festa surpresa com todos os familiares reunidos. Ele não se continha de tanta alegria.

A cor vermelha era sua favorita. Até a sua gelatina tinha que ser nessa cor e, de preferência, como sobremesa para sua comida preferida: frango com quiabo.

Muito positivo, carregava consigo sempre a certeza de que tudo ia dar certo. Era muito carinhoso, amava dar beijos e abraços e, todos os dias, mandava áudio para os amigos e familiares para saber como estavam.

Era muito querido por todos e, sem ele, é impossível não chorar aos finais de semana, principalmente no almoço de domingo, quando o seu lugar à mesa permanece vazio. Resta como consolo o sentimento de que os corações e memórias continuam cheios de suas lembranças.

Irineu nasceu em Lins (SP) e faleceu em Jundiaí (SP), aos 61 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela filha de Irineu, Vanessa Umbelino. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Emily Bem, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 30 de novembro de 2021.