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José Maria Ferreira Rodrigues

1942 - 2020

Inteligente, irrequieto e às vezes impaciente, porém amoroso e devotado à família.

Por ser muito falante, inteligente e irrequieto, recebeu na infância o apelido de Zeca Periquito. Adulto, passou a ser o Zeca, nome pelo qual ficou conhecido por quase todas as pessoas.

Homem simples, espirituoso e dedicado à família, era sincero e transparente ao demonstrar seus afetos, gostos e preferências. Se gostava, todos percebiam, mas se não gostasse de alguém ou alguma coisa, seu descontentamento era visível.

Zeca tinha paixão por motores e orgulhava-se em ter concluído o curso de Torneiro Mecânico pelo SENAI, o que o levou a trabalhar na manutenção de aeronaves.

Em casa, era o "Severino" ─ termo utilizado para ilustrar o profissional que faz um pouco de tudo. Com suas habilidades, fazia reparos nos eletrodomésticos e adorava transformar ou inventar coisas que considerava úteis, usando sua criatividade e imaginação.

Aposentado, criou em sua residência um pequeno espaço que chamava de "Ferramentaria", onde guardava e organizava o que, para ele, eram bens preciosos e motivo de muito ciúme: suas ferramentas.

Zeca era o homem das urgências. Quando fazia um trabalho, queria logo concluir. Apressado e ansioso, não tinha paciência para longas esperas, principalmente em filas de banco ou coisas do tipo. Ao visitar alguém, logo que chegava já ia avisando que não podia demorar ─ pois sempre tinha algo importante a fazer ─, o que gerava muitos protestos por parte da esposa, que queria estender um pouco mais a conversa e prolongar a visita.

Ainda assim, manteve um relacionamento duradouro com a companheira Norma, a quem chamava carinhosamente de Norminha ou de Nega. Eram muito diferentes: ele, sempre irrequieto e apressado. Ela, a calmaria em pessoa. "Acredito que eu precisava da pressa dele, assim como ele precisava da minha calma... e que o amor, na verdade, foi o alicerce dessa união estabelecendo um ponto de equilíbrio entre nós, fazendo com que um respeitasse o ritmo do outro", diz Norminha.

Foram casados por quarenta e sete anos, tendo nascido dessa união os filhos, Luciana, Nilo, Cláudio e Andréa. Sua maior alegria era estar na companhia de sua prole, conversar sobre política e ouvir suas histórias e realizações no trabalho. Orgulhava-se deles e sorria envaidecido com suas conquistas. Nessas ocasiões, despia-se de sua habitual pressa e se tornava um homem paciente e atencioso.

A mesma atenção dispensava aos netos, Isabella, Pietra, João Pedro, Gabriela, João Arthur e Luiz Henrique, pelos quais demonstrava muito amor. Todos guardam boas lembranças do avô. Isabella, a primeira neta e quem mais conviveu com ele, o chamava de pai. Ela costuma se dizer sortuda, pois, numa só pessoa, teve duas versões: a de pai e a de avô. Zeca fazia de tudo para alegrar os netos. Pietra recorda que, quando era pequena, o avô armava a piscina de plástico e ficava estimulando para que ela pulasse, atribuindo a cada pulo um nome engraçado, que dizia ser de um peixe. Com João Pedro, costumava conversar sobre vários assuntos. Como adepto da Doutrina Espírita, falou para o neto sobre o planeta Capela e a civilização que habitava esse planeta. Porém, diz o João, "o que mais me faz lembrar o vovô é que, quando mamãe não me deixava tomar refrigerante, ele me chamava secretamente e dizia que no seu frigobar havia Coca-Cola e que eu poderia tomar quando tivesse vontade. Era um segredo que só nós dois sabíamos."

Mesmo não admitindo que mexessem em suas coisas, com os netos ele era permissivo. Gabriela, muito curiosa, ficava a mexer no armário do avô, pois certo dia ele lhe contara que havia um tesouro escondido e ela, muito esperta e sapeca, queria ser a primeira a desvendar tal mistério e capturar o tesouro perdido para si. Com os netinhos João Arthur e Luiz Henrique, costumava colher as acerolas e molhar as plantas do quintal. Dava boas risadas vendo as travessuras dos dois, principalmente quando imitavam o seu jeito de andar com a bengala.

Divertia-se com as brincadeiras dos netos da mesma forma que embarcava nas aventuras dos filhos quando eles eram pequenos. Certa vez, levou a criançada de casa e da vizinhança para acampar em um terreno afastado da cidade e passou uma noite inteira ensinado as coisas que aprendeu na infância, quando era escoteiro.

Esse era o Zeca. Um homem que amava a família e que também era muito amado, inclusive pelo genro Franswilliam e pela nora Carol, que o tratavam com extrema consideração e carinho.

Os familiares e amigos lembram do tradicional café que ele fazia questão de preparar e servir a todos que frequentavam sua casa. Mal a pessoa chegava, já surgia o convite: "Vamos tomar um café?". Isso se tornou marcante para os que conviveram com ele.

Zeca e Norminha estavam sempre juntos: nas leituras da Bíblia, nas conversas diárias e nas sessões de filmes por um serviço de streaming. Foram companheiros na saúde e na doença e contaminados pela Covid-19 quase simultaneamente.

Quando o estado de saúde dele se agravou, foi levado ao hospital e, no caminho, mesmo sofrendo, mantinha-se calmo e dizia para os filhos repetidas vezes: "Está tudo bem. Tamo junto!"

Essa frase até hoje permanece viva na memória dos filhos. Ao trocarem mensagens pelo aplicativo no grupo da família, procuram fortalecer o vínculo e a memória do pai repetindo sempre: "Tamo junto!".

José nasceu em Belém (PA) e faleceu em Belém (PA), aos 77 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela esposa de José, Norma Geraldina Velasco Rodrigues. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Ana Macarini e moderado por Rayane Urani em 3 de fevereiro de 2021.