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Maria Natércia Araujo Macedo

1927 - 2020

Uma mulher de poucas palavras e atitudes sábias.

O texto abaixo foi enviado pela neta Ligia, por intermédio de sua irmã Verônica:

“Ei Naná,
Você que me fez menina-moça-mulher.
Tenho mais de ti do que pode imaginar.
Tua força nunca vi tamanha, jamais terei igual!
O teu silêncio é professor!
Falar só o necessário é tua sabedoria de vida.
Quem dera eu: observar, digerir e só ficar com aquilo que é bom. O que não presta, não importa! Deixa para o tempo entender!
Muito me ensina esse gosto pela vida, esse apreço pela boniteza e pelo o que é saboroso. Afinal, o que essa vida senão o bom gosto?
Não puxei sua vaidade e cuidado, talvez só a boniteza...
Naná, senhora de si, sempre soube o que quis...
Por que dizer se já senti? Por que dizer se já ouvi? Por que dizer se já foi? Era isso que sempre dizia o seu silêncio.
‘Meu pai me ensinou a falar só o necessário’, foi o que a senhora me contou um dia.
Eu que peco pela boca e tenho muito a aprender com seu olhar, com seu ‘não-falar’ ou suas poucas palavras... quando vi, já me perdi na falação.
Vó, você me ensinou que tá tudo gostoso, basta provar!! Você sempre soube o quanto era suficiente, o que queria... Se eu te servia um copo d'água era: ‘chega, chega! Tá bom, menina! Foi é muito! Vixe’
Mais que ninguém, a senhora me ensinou a aproveitar o presente: comida boa, bebida gostosa e estar bem arranjada pra ocasião! Esse bem arranjada era o vestido, o batom , o perfume, sem esquecer dos brincos!
‘Deschetá’ (Deixe estar), você dizia. Era como: deixa pra lá, uma hora a vida ensina...
Se a senhora está indo encontrar "seu Hecílio", mande um “chêro no cangote” e leve um camburão de café! Com amor e capricho, assim como o seu crochê.

Da sua neta mais esquisita, Lígia.

Maria nasceu em Camocim (CE) e faleceu em São Paulo (SP), aos 92 anos, vítima do novo coronavírus.

História revisada por Ticiana Werneck, a partir do testemunho enviado por neta Verônica Araujo Macedo Medeiros, em 20 de julho de 2020.