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Vilma Saldanha Ribeiro

1956 - 2021

Ela fez jus a todos os significados de seu nome e cultivou amor por onde passou.

Esta é uma homenagem de Sofia para sua tia, Vilma:

“A falecida era solteira. Não deixou bens nem testamento, não deixou filhos.”

Foi isso que eu vi quando li a certidão de óbito dela. Não consigo acreditar até hoje. Dona Vilma talvez não tenha deixado herança em dinheiro, mas com certeza deixou seu legado aqui. A memória dela nunca será esquecida.

Ela era minha tia, e nasceu no dia 28 de março. Ariana raiz, tinha pressa pra tudo e paciência pra quase nada. Mas o seu jeitinho aperreado era só mais um dos seus incontáveis charmes.

Vilma significa "a que protege", "protetora corajosa" ou "a que usa a vontade para proteger." Eu não conheço todas as Vilmas do mundo, mas conheci uma que fazia jus a todos os significados do seu nome.

Por vezes, era brava e me repreendia, mas sei que não fazia por mal.

Tinha um coração enorme essa Dona Vilma, era sensível e se emocionava em todos os seus aniversários. Tinha um amor gigantesco dentro de si e um senso de doação ao próximo admirável. Viveu e fez de tudo pela família. Sempre teve muitas responsabilidades nos ombros, era uma das mais velhas dentre os doze irmãos. Conheceu o trabalho e a rigidez da vida cedo demais, mas sempre foi a alma da festa. Tinha muita vontade e disposição de viver.

Tia Vilma nunca foi mãe de sangue, mas era mãe de coração para os sobrinhos, afilhados e de quem mais quisesse, pois sempre foi boa demais para esse mundo.

As roupas dela dobradas na cômoda... Os óculos com a cordinha pendurada... O radinho que escutava sempre antes de dormir... A casa cheia nas datas comemorativas e sua silhueta na cozinha... O cheiro do café que ela sempre passava durante o intervalo da novela... A figura dela dançando, segurando um copo de cerveja,,. Que sorte eu tive de testemunhar tudo isso! Que honra a minha poder sentir o amor que ela transmitia!

Desde que ela se foi, tenho tentado ressignificar meus dias 11, dia em que ela partiu, mas o luto não é um processo linear. Um dia de cada vez. Uma saudade de cada vez.

Amável. Apressada. Irreverente. Brava. Cuidadosa. Gentil. Engraçada. Eu poderia passar horas e horas tentando achar adjetivos que a descrevam, mas seria em vão demais. A experiência de compartilhar da vida dessa mulher na Terra foi singular e bonito. Eu só queria que ela pudesse ficar um pouquinho mais, que se demorasse mais... Que alegria seria passar mais um Natal com você, hein? Que fosse embora desse mundo aos 100 anos, velinha, rabugenta e esquecida.

O legado que você deixou aqui na Terra é eterno e lindo. O amor que nós sentimos por você ultrapassa qualquer barreira entre a vida e a morte. Daqui existe uma família que amou você até o seu último suspiro, e que tem a plena certeza de que foi amada da mesma forma por você.

Tomara que um dia, nos caminhos da eternidade, a gente se esbarre por aí, minha querida Tia Vilma.

Com amor,
da sua sobrinha Sofia, que sente sua falta todos os dias.

Vilma nasceu em Belo Horizonte (MG) e faleceu em Belo Horizonte (MG), aos 65 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela sobrinha de Vilma, Sofia Lara Saldanha Rocha. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 5 de setembro de 2022.