1947 - 2020
O “Guardião dos Anjos”, médico pediatra que protegia até com as palavras.
O Dr. Antonio José defendia seus ideais e protegia seus pacientes como um verdadeiro guardião. “Este é o título que melhor expressa esse pediatra”, afirma o amigo Everson. “Ao longo de sua vida, foi um grande defensor do Sistema Único de Saúde (SUS) e do acesso da população carente à Saúde Pública. Dentre suas atividades estavam o atendimento às famílias carentes nas cidades-satélites do Distrito Federal (DF). Ele defendia suas ideias e seus valores com paixão e fortes argumentos.”
Pediatra, teve a carreira profissional marcada por muitas lutas e aprendizados. “Formou gerações de colegas no Distrito Federal, trabalhou com muito esmero, dedicação e desprendimento em vários hospitais no estado, como o Universitário, o Regional de Taguatinga e de Brazlândia, e atuou no Sindicato dos Médicos do DF e na Federação Nacional de Médicos”, conta o amigo.
Everson narra como o seu caminho cruzou o de Antonio José: “Ele entrou na minha vida e da minha família quando meu irmão foi diagnosticado com Diabetes Tipo 1 em 1978, no antigo Hospital Presidente Médici (atual Hospital Universitário de Brasília – HUB). Em determinada ocasião, sua intervenção foi decisiva para a vida do meu irmão, o qual estava internado na UTI com hiperglicemia e já havia sido medicado com várias doses de insulina. A glicemia não baixava. O Dr. Antonio José havia chegado de férias e foi direto para o hospital. Graças a Deus, ele evitou uma superdose de insulina que poderia ter matado o meu irmão”.
Em seguida a esse ato de cuidado e proteção à vida, a gratidão e a confiança passaram a fazer parte da relação daquela família com o Dr. Antonio José. Depois do irmão, Everson também passou a ser acompanhado pelo pediatra, quando ele tinha sete anos, e o número de pacientes da família só foi aumentando, estendendo-se aos primos e às outras crianças.
Como paciente, Everson reconhece que as “duras orientações” do médico aos pais surtiram bons efeitos, pois o ajudaram a ser quem é hoje. “Afinal, este foi um dos dons do ‘Guardião dos Anjos’ – falar de como cuidar de nossa saúde e de como poderíamos ser quando crescêssemos.”
A representação do guardião protetor tornou-se o pilar daquela relação médico-paciente-família, que transpôs as fases da infância e adolescência, crescendo de tal modo que adentrou a vida adulta, como conta Everson: “Em 1995, passei em um concurso público e mais uma vez fui conversar com meu ‘Guardião’ sobre os exames admissionais”.
Esse contato, porém, não se limitou a um mero aconselhamento. A relação de confiança entre médico e paciente já dava sinais do seu processo de transformação, saltando do âmbito profissional para o pessoal, mudança percebida quando o Dr. Antonio José e sua esposa compareceram na celebração do matrimônio de Everson, compartilhando, além da companhia, o seu exemplo de união. “Em 2003, em meu casamento, recebemos um dos melhores presentes, um sorriso dele acompanhado da frase – ‘não podia deixar de vir, vocês são como filhos’. Então, naquele momento, o ‘Guardião’ e sua amada Glória se eternizaram em minha memória e de minha esposa. Um exemplo de casal que, depois, chegou às bodas de ouro. Isso não é para qualquer um”, recorda o ex-paciente que se tornou amigo de seu médico.
Apesar da vida corrida, Everson e Antonio José mantiveram contato ao longo dos anos, sendo algumas vezes a família surpreendida com a visita do médico ‘Guardião’. O laço de amizade não afastou a relação de cuidado, quando Everson, agora amigo, foi diagnosticado aos 38 anos com Diabetes Mellitus, assim como o seu irmão na infância. Nesse momento, comenta Everson, o “‘Guardião dos Anjos’ veio em meu socorro, com o cuidado de sempre, com suas orientações e conselhos”.
As palavras do Dr. Antonio José, tomadas pela forma de recomendações, revestiam como um manto o amigo Everson, que sempre recorria a elas antes da tomada de uma decisão em seu tratamento para Diabetes. Até nos momentos mais difíceis suas palavras de cuidado estavam presentes.
Everson, no início da pandemia de Covid-19, contatou o Dr. Antonio José, preocupado com sua saúde, após saber que ele e a esposa haviam contraído a doença. “Troquei mensagem com ele, que me disse ter acordado muito bem e como sempre, exercendo a função de ‘Guardião dos Anjos’, me enviou uma mensagem de voz cheia de conselhos e recomendações. Mas nos dias seguintes o seu quadro e o da esposa se agravaram. Sua amada Glória acabou falecendo e cerca de 30 dias depois o Dr. Antonio José.”
E assim, o “‘Guardião’ nos deixou, foi para o céu encontrar os demais anjos”, encerra, emocionado, o paciente-amigo Everson.
Antonio nasceu no Espírito Santo (ES) e faleceu em Brasília (DF), aos 73 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pelo amigo de Antonio, Everson Aguiar. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Rosimeire Seixas, revisado por Paola Mariz e moderado por Rayane Urani em 17 de janeiro de 2021.