1941 - 2020
Médico dedicado, apaixonado por cinema e pelas estrelas. Observava o céu com a neta nas noites claras.
Esta é uma carta aberta de Paula para o seu avô, Renaud:
Vô, você se foi e deixou muitas lembranças. Eu adorava quando a gente fazia maratonas de filmes, comia pipoca, tomava café expresso na máquina nova que você havia recém-adquirido.
Quando tinha uma cena mais forte no filme, você falava pra tapar os olhos. Eu ficava olhando entre os dedos e, quando acabava, você me perguntava se eu tinha visto. Você era cinéfilo, tinha coleções de filmes... Amava tecnologia, tudo que lançavam, corria pra comprar.
Sempre deu conselhos muito sábios. Ensinou-me a abrir latas, logo eu ─ canhota ─, demorei meses, mas você me ensinou diariamente, até eu conseguir, e falava pra eu ter persistência.
Quando você atendia seus pacientes no consultório que montou em casa, eu ficava atrás, doida pra acompanhar as consultas, e você dizia: "minha filha, não posso deixar você participar, são assuntos particulares".
E mesmo assim eu ficava pra ver tudo. Alguns pacientes, que já eram antigos, deixavam que eu participasse das consultas. Você falava pra eu ficar quietinha e eu ficava sentadinha num banquinho, no canto do consultório, observando tudo que você falava, observando você examinar seus pacientes, sentia orgulho do médico que você era, sempre tão atencioso... Não corria, seus atendimentos passavam de uma hora.
Vô, quanta saudade! Você falava que eu tinha que estudar, aprender sobre tudo, ser sempre melhor em tudo que eu fizesse na vida; qualquer profissão que eu viesse a ter, precisaria me dedicar e ser cada dia melhor. Deu pra mim seus livros da época que se formou em Química pelo Cefet.
Você foi meu exemplo. Era químico, meteorologista e médico. Foi guerreiro e batalhou pra conquistar tudo que construiu. Te amo tanto, vô... Lembro-me de você falando: "Vem com o vovinho, vem." Brincava de serra, serra, serrador comigo em seu colo.
Você era sarcástico, adorava tirar sarro dos outros.
Contava estórias de alienígenas, chamava pra ir até o terraço de casa com seu binóculo para observar o céu, falava das estrelas, dos planetas... Sempre que o céu estava estrelado, você me chamava para observarmos juntos.
Vô, minha infância foi marcada demais pelos seus ensinamentos. Você amava a ciência e fez com que me apaixonasse também.
Nos últimos anos, depois que você se mudou de Niterói e eu ia visitá-lo em Floripa, ficávamos conversando a madrugada toda sobre artigos científicos. A gente dividia amor pela fisiologia humana e anatomia, falávamos tanto que, quando olhava no relógio, já eram quase 5 horas da manhã! Isso vai deixar muita saudade, você não imagina como.
Te amo pra sempre!
De sua neta mais velha, Paula Frazão.
Renaud nasceu em Luís Correia (PI) e faleceu em Blumenau (SC), aos 79 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela neta de Renaud, Paula Renata Bruno Frazão Wermelinger de Medeiros. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Talita Camargos, revisado por Lígia Franzin e moderado por Phydia de Athayde em 11 de janeiro de 2021.